APROVADO na terça-feira (22), o pedido da JBS para ingressar na bolsa de valores de Nova York é alvo de críticas de organizações ambientalistas internacionais. A previsão é de que as ações da maior companhia de proteína animal do mundo, com faturamento de R$ 416 bilhões em 2024, em a ser comercializadas no Brasil e nos Estados Unidos a partir de junho — a chamada “dupla listagem”.
A entrada da JBS no mercado de ações norte-americano revela “fraquezas profundas e sistemáticas” no sistema financeiro da principal economia do planeta, e representa uma falha na prevenção a riscos socioambientais, avalia Alexandria Reid, líder de campanha da Global Witness.
“Empresas como a JBS desempenham um papel desproporcional no desmatamento, e é do interesse dos mercados, das pessoas e do planeta implementar marcos regulatórios e de divulgação rigorosos”, afirma a ambientalista.
Antes do sinal verde da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC) para a listagem das ações da JBS na bolsa de Nova York, cobiçada há dez anos pela companhia, o jornal New York Times revelou que uma das subsidiárias do grupo empresarial foi a maior doadora do comitê de posse do presidente Donald Trump, em janeiro. O aporte de US$ 5 milhões (R$ 28,4 milhões, na cotação atual) feito pela Pilgrim’s Pride superou o de gigantes como Google, Meta e Amazon.
Questionada, a assessoria de imprensa da JBS informou que a doação era de responsabilidade da Pilgrim’s Pride, sediada nos Estados Unidos. Em nota à Repórter Brasil, a subsidiária afirmou que a empresa “tem uma longa tradição bipartidária de participação no processo cívico”.
Cristiane Mazzetti, do Greenpeace Brasil, afirma que não é “surpreendente” o fato de a JBS ter obtido aval para entrar na bolsa de Nova York, diante do atual cenário político norte-americano. “Apesar dos sucessivos alertas das organizações da sociedade civil quanto aos riscos dessa dupla listagem, o aceite foi concedido, em alinhamento com um governo que recorre ao negacionismo climático — o que reforça a necessidade de regulação desses fluxos financeiros”, afirma.
A entidade ambientalista Mighty Earth também publicou nota apontando uma série de denúncias de violações ambientais e de direitos humanos associadas à JBS. “Esperamos que a Bolsa de Valores de Nova York não seja tão fácil de corromper e mantenha seus padrões, mantendo uma empresa conhecida por corrupção e desonestidade fora do mercado”, diz Glenn Hurowitz, CEO da entidade.
A operação da empresa já chegou a ser questionada pela Procuradoria-Geral de Nova York, que processou a empresa “por enganar o público sobre o seu impacto ambiental”. A assessoria de imprensa da JBS rebate as acusações e afirma que a ação movida pela procuradoria “foi rejeitada pela Justiça americana”.
A Repórter Brasil também questionou a assessoria de imprensa da JBS sobre as críticas das organizações ambientalistas, mas não obteve retorno sobre esse ponto até o fechamento desta matéria. O texto será atualizado se um posicionamento for enviado.
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Investigação mostra como fornecedores da JBS burlam controle para vender gado criado em áreas desmatadas
Com a aprovação do pedido de listagem pela SEC, faltam apenas o aval da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) do Brasil e a votação da proposta pelos acionistas para o início da venda dos papeis no mercado norte-americano. A previsão da empresa é de que o processo seja concluído até junho.
Para viabilizar a operação, a holding J&F — controladora da JBS — fechou em março um acordo com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), pelo qual a instituição se comprometeu a se abster da votação sobre a proposta. O banco estatal controla 20,81% das ações da empresa e já posicionou contra tentativas anteriores de listagem no exterior.
A JBS tenta a partir da listagem na Bolsa de Nova York atrair mais investimentos e melhorar sua imagem pública. Há anos, a companhia é alvo de críticas pelos riscos ambientais associados à sua cadeia produtiva. Segundo o MapBiomas, mais de 90% da vegetação suprimida na Amazônia entre 1985 e 2023 deram lugar a pastagens.

A JBS anunciou metas para eliminar o desmatamento da cadeia na Amazônia e no Cerrado até 2025. Investigações da Repórter Brasil, no entanto, vêm apontando brechas nos controles da empresa. Em abril, uma matéria revelou como pecuaristas usam intermediários e até falsificam documentos para vender gado criado em áreas desmatadas irregularmente. Mais de 35 pessoas do setor descreveram as estratégias para burlar os filtros da empresa, prática conhecida como “lavagem de gado”.
Outra promessa da empresa é a de zerar as emissões de gases causadores do efeito estufa até 2040. O metano, gás gerado pelo processo digestivo dos bovinos, é o segundo mais abundante na atmosfera, atrás apenas do dióxido de carbono (CO2), gerado pela queima dos combustíveis fósseis, queimadas e desmatamento.
No ano ado, a Repórter Brasil revelou que a filial norte-americana da JBS investiu 203 mil dólares no AgNext, centro de pesquisa da Universidade Estadual do Colorado que desenvolve estudos para reduzir a percepção do impacto climático da pecuária. A empresa também financiou conteúdos sobre o AgNext em veículos como Wall Street Journal e Politico, com o objetivo de destacar os “esforços para construir uma pecuária sustentável”.
Durante entrevista à Reuters em janeiro deste ano, o diretor global de sustentabilidade da companhia, Jason Weller, afirmou que a meta climática nunca foi uma “promessa formal”, mas uma “aspiração”. Depois da publicação, a empresa enviou nota à agência de notícias negando mudanças de posicionamento e sustentando que “qualquer afirmação em contrário é completamente falsa”.
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